Ainda não existe consenso entre os sócios da Unitel sobre a realização ou não de uma auditoria forense às contas do exercício dos últimos 10 anos, um dos pontos da agenda da assembleia-geral da operadora de telefonia que iniciou a 27 de Julho e cuja conclusão estava marcada para esta segunda-feira, 10 de Agosto.
“Ainda não existe uma decisão se haverá ou não a auditoria forense”, garantiu ao VALOR fonte da operadora, acrescentando que a falta de consenso entre os sócios se deve ao entendimento segundo o qual “a auditoria forense, em princípio, são para casos de fraude e, na Unitel, não há indícios de fraude” defendido por parte dos accionistas.
Ao VALOR, o advogado Albano Pedro manifesta o mesmo entendimento, sustentando que “só se solicita uma auditoria forense quando há um processo em curso”, visto que, “quando se diz auditoria forense, está a falar-se de uma auditoria desencadeada no âmbito de uma actividade jurisdicional, de uma actividade do tribunal”. “Esta auditoria é desenvolvida por especialistas forenses. Poderão estar auditores forenses, contabilistas forenses, economistas forenses que são chamados pelo próprio tribunal a desenvolver este trabalho de auditoria e o objectivo deste trabalho é apurar matérias criminais, a existência de irregularidades que ponham em causa a boa gestão, mas no âmbito de um processo de suspeição, de um processo que está a correr.”
O jurista diz não conseguir “perceber como é que a sociedade civil solicita uma auditoria forense sem processo em curso”, argumentando que “isso não é possível”. “Ou há pessoas que querem criar argumentos para impressionar ou não têm conhecimento do sentido e alcance dos conceitos. Nem mesmo a Procuradoria, durante a investigação, pode fazer uma auditoria forense, é desenvolvimento no âmbito do julgamento”, esclarece o advogado.
Albano Pedro lembra que “as auditorias desenvolvidas pelo Tribunal de Contas são forenses”, mas explica que este tribunal “não faz uma intervenção a pedido de particulares porque não é um tribunal de partes”. “A minha questão é se eles solicitam que o Tribunal de Contas intervenha. Será isto? Vamos supor que sim. O nosso Tribunal de Contas não desenvolve uma actividade de julgamento de partes em litígio. Ainda que tivéssemos de falar do Tribunal de Contas, o conceito é despropositado, não vejo como enquadrar o Tribunal de Contas. Portanto, ainda assim é de descartar.”
O também advogado David Mendes entende que “esta auditoria é requerida nos processos”. “Não tenho conhecimento que haja algum procedimento judicial. A não ser que tenha havido uma auditoria não judicial, cujo resultado contesta, não sendo assim, fico sem saber qual é o valor desta auditoria forense”, argumenta.
Auditoria Forense na Sonangol?
Segundo apurou o VALOR, a auditoria forense consta da agenda da assembleia-geral da Unitel por solicitação da Sonangol e a posição da petrolífera tem estado a provocar acesos debates informais entre funcionários seniores da Sonangol, visto existir uma corrente a defender que seria, primeiro, a própria Sonangol a ser alvo de uma auditoria semelhante.
“Nunca fizeram auditoria forense à Sonangol com a roubalheira toda que anda por lá, mas agora a Sonangol quer fazer na Unitel? Engraçado!”, argumentou, por exemplo, um ex-administrador da petrolífera, acrescentando que “foi com enorme estupefacção” que tomou conhecimento da intenção da Sonangol.
“Então, para quando auditoria forense às contas da Sonangol nos últimos 10 anos, ao Banco Besa e ao Banco Económico nos últimos 10 anos, às instituições financeiras e não financeiras do universo Besa e Sonangol?”, questiona um dos administradores do actual conselho de administração.
Essas interrogações, de resto, vão ao encontro das questões levantadas durante anos por partidos na oposição, sobretudo a Unita, e membros da Sociedade Civil que defendem, por exemplo, a realização de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) às contas da petrolífera.
David Mendes entende que a própria Sonangol deve entender que “as suas contas são questionadas”, salientando ser esta “a razão de permanentemente se evocar a necessidade de uma CPI”.
Entende, no entanto, ser “subjectivismo” correlacionar a intenção da Sonangol de acompanhar as contas na Unitel com a não realização de uma CPI nas suas contas. “A Sonangol, como investidora, tem direito de saber das contas onde investiu, é um direito, agora se ela própria não faz o problema é do dono da empresa, neste caso, do Estado, quer dizer que o próprio Estado é que não se tem preocupado com o seu dinheiro”, argumentou.
Quem entende existir relação é o também jurista Salvador Freire, para quem “é vergonhoso uma empresa da dimensão da petrolífera, que é a maior do país, pedir auditoria forense à Unitel”, quando as suas próprias levantam questionamentos.
A Sonangol é detentora de 50% das participações da Unitel, enquanto a Vidatel, de Isabel dos Santos, e a Geni, de Leopoldino do Nascimento, repartem, equitativamente, os outros 50%.