Suspeitos de corrupção, Helder Vieira Dias e Leopoldino Fragoso do Nascimento foram ouvidos na DNIAP durante sete horas. Em causa, processo relacionado com contratos entre o Estado e a empresa China International Fund.
Pouco se sabe da audiência aos generais “Kopelipa” e “Dino” na Direção Nacional de Investigação e Ação Penal (DNIAP), órgão da Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola, esta terça-feira (13.10). Apenas que o general Helder Vieira Dias “Kopelipa”, chefe da Casa Militar da Presidência angolana na era do anterior chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, e o general Leopoldino “Dino” Fragoso do Nascimento, chefe das comunicações no anterior regime, foram ouvidos pela primeira vez desde que foram constituídos arguidos, em setembro, e que a sessão terá durado sete horas.
O processo, diz a defesa, está em segredo de justiça. E, por isso, nem os generais nem o advogado prestaram declarações à imprensa no final da sessão.
Entre outros crimes, os mais temidos generais da governação do ex-Presidente José Eduardo dos Santos são acusados de peculato, branqueamento de capitais e burla, num processo relacionado com uma linha de crédito de 2,5 mil milhões de dólares concedida pelo Banco Industrial e Comercial da China a Angola. Dino e Kopelipa são suspeitos de se apropriarem destes fundos por intermédio da empresa China International Fund.
Ambos os generais, que estão a ser defendidos pelo escritório de advogados “Sérgio Raimundo e Associados”, “escaparam” dos holofotes da imprensa, mas fonte da DNIAP confirmou a presença dos generais desde hoje cedo.
À saída da audição, o advogado angolano Sérgio Raimundo não prestou qualquer declaração à imprensa, “temendo” uma eventual punição da Ordem dos Advogados de Angola (OAA). “Não dá [para falar], a OAA agora está muito rígida”, disse o advogado, já no interior da sua viatura.
As audições devem prosseguir na quarta-feira na sede da DNIAP, em Luanda.
Mil milhões não extinguem responsabilidade
Segundo o jornal português Expresso, os generais angolanos terão escrito ao Presidente João Lourenço mostrando-se dispostos a entregar ao Estado ativos no valor de mil milhões de dólares, embora fonte do escritório “Sérgio Raimundo e Associados” negue que “Dino” e “Kopelipa” tenham cedido à pressão judicial.
Uma coisa é certa, diz Salvador Freire, jurista e presidente da associação Cívica Mãos Livres: “As investigações prosseguem” e a alegada disponibilidade dos generais para a devolução dos ativos não extingue a responsabilidade criminal. “Evidentemente, quando eles fizerem a devolução destes bens subtraídos do erário público, isso apenas vai aliviar, atenuar”, afirma Salvador Freire. No entanto, ressalva, “há a ação, há o dolo, e essa responsabilidade criminal deverá ser imputada aos supostos criminosos que usurparam os valores do erário público”.
Ao Estado seriam alegadamente entregues ativos como percentagens da empresa Biocom, a Damer, maior gráfica do pais, o hipermercado Kero, e um “o vasto universo empresarial do CIF, que inclui uma fábrica de cervejas, uma central térmica e uma linha de montagem de autocarros”, diz o Expresso.
Mas Adalberto Costa Júnior, líder da oposição angolana, desconfia que esses ativos não correspondem à totalidade dos valores supostamente desviados do erário, “porque se o valor é o empréstimo retirado para fazer a compra, nós sabemos que ali alguns tipos de fábricas receberam, por exemplo, financiamento de mil milhões de dólares e que não valem a metade do dinheiro. E foram feitas entregas, provavelmente até porque já não era conveniente os seus proprietários ficarem com elas”.
Alguns cidadãos manifestam receio em relação ao passivo destas empresas. Muitas delas têm muitas dívidas, sobretudo aos seus fornecedores.
Imunidades não podem travar justiça
Os generais estão a ser ouvidos na condição de arguidos para lhes serem aplicadas as respetivas medidas de coação, mas não podem ser presos preventivamente antes do despacho de pronúncia, na fase de instrução contraditória, pois “gozam de imunidades”.
Para além dos generais Helder Vieira Dias “Kopelipa” e Leopoldino de Nascimento “Dino”, outras altas figuras como, por exemplo, Manuel Vicente ex vice-Presidente angolano e patrão da Sonangol, poderão ser arroladas neste processo. Para Salvador Freire, é preciso que todos sejam responsabilizados, mesmo que isto implique a retirada de imunidades: “Quer o Manuel Vicente como qualquer outra pessoa que foi PCA de uma empresa pública e tenha retirado valores e, como tal, há investigações profundas de que estes cometeram os crimes de peculato e branqueamento de capitais, devem responder”.
O caso voltou a trazer a tona a suposta forma “seletiva” como se tem levado a cabo a “cruzada contra a corrupção”, diz Adalberto Costa Júnior, presidente da UNITA: “Temos outros casos com evidentes provas de corrupção onde o protecionismo é absoluto. Dois pesos e duas medidas, particularmente membros do Governo. E nós nunca dissemos que não há combate à corrupção, nós temos estado a dizer que o combate à corrupção é dirigido. Há perseguidos e há protegidos, o que é grave. Anula o seu efeito”.